terça-feira, 30 de dezembro de 2008


Num ano que se avizinha cinzento e tristonho, em que o ambiente de crise reina, não resisto a relembrar um poema de Pessoa, que me inspira a encontrar forças para um novo ano.


O Monstrengo, Fernando Pessoa.


O Monstrengo que está no fim do mar,

Na noite de breu ergueu-se a voar

À roda da nau voou três vezes,

Voou três vezes a chiar,

E disse “Quem é que ousou entrar

Nas minhas cavernas que não desvendo,

Meus tectos negros do fim do mundo?”

E o homem do leme, disse tremendo,

“El-Rei D. João Segundo!”


“De quem são as velas onde me roço?

De quem as quilhas que vejo e ouço?”

Disse o Monstrengo, e rodou três vezes,

Três vezes rodou imundo e grosso,

“Quem vem poder o que só eu posso,

Que moro onde nunca ninguém me visse

E escorro os medos do mar sem fundo?”

E o homem do leme tremeu, e disse,

“El-Rei D. João Segundo!”


Três vezes do leme as mãos ergueu,

Três vezes ao leme as reprendeu,

E disse no fim de tremer três vezes,

“Aqui ao leme sou mais do que eu:

Sou um povo que quer o mar que é teu

E mais que o Monstrengo, que me a alma teme

E roda nas trevas do fim do mundo,

Manda a vontade, que me ata ao leme,

De El-Rei D. João Segundo!”


1 comentário:

Douglas William Machado. disse...

Excelente blog! E grande poema do grande Pessoa, haha.