domingo, 20 de agosto de 2006

Aprender, aprender sempre...


As experiências são sempre enriquecedoras. Sejam elas curtas ou longas, os resultados dependem da capacidade que cada um tem de interagir com o meio. Essa capacidade reflecte no fundo os critérios que aprendemos a usar para viver a realidade. Este intróito chato só se justifica porque, em conversa com uma amiga sobre a viagem à Polónia, aprendi mais uma coisa que considero um elemento-chave - a importância do conhecimento prévio e das ideias preconcebidas.

Quando visitava Oswieçim – já devem ter percebido que uso este nome por respeito ao povo Polaco e ao seu direito à auto-determinação - para além da enorme carga emocional da experiência, toda aquela paisagem de edifícios e estradas largas ladeadas de árvores no auge da sua folhagem me despertava um sentimento de inquietude que não sabia explicar. Na verdade, este sentimento terá estado na mente de muitos senão a quase totalidade dos presos ali assassinados pelas SS. E digo isto porque, ao contrário do meu caso, aquando da sua chegada ao campo, a sua maioria não sabia o que se passaria naquele local. Escreverei sobre a importância da informação e da vivência de experiências na primeira pessoa, como forma de mudar comportamentos, numa outra oportunidade. As imagens mostram hoje a mesma paisagem de há 65 anos, quando os primeiros presos para ali foram transportados. A minha cabeça tem tantas ideias que não consigo extraí-las todas. A minha inquietude não é, seguramente, a mesma que sentiam os desafortunados que ali foram assassinados, desde logo porque estava em causa a sua vida e portanto, tudo o resto perde relevância.

Mas se por um lado o meu conhecimento prévio dos acontecimentos havidos naquele local me causava uma ansiedade inexplicável, já a qualquer pessoa que ali se deslocasse sem saber nada sobre o que ali se passou, certamente que tal não sucederia. Numa primeira ideia, apetecia-me trazer ali todas as pessoas do mundo para que vissem com os seus próprios olhos as marcas dos crimes horrendos cometidos contra tantos inocentes. Foi assim que começou a conversa com a minha amiga. Devias lá ir – disse eu com toda a propriedade! Com a calma que lhe é característica, ela respondeu-me dizendo que não precisava de lá ir para acreditar no Holocausto, nem tão pouco de ver os locais onde ele teve lugar, para estar ciente da tragédia em causa. Disse-me então que o que sabia e o que tinha aprendido bastava. Logo me pareceu uma resposta muito feita e pouco séria – um pouco como é minha característica às vezes – mas ela continuou dizendo que se alguém que nunca tivesse sabido de nada sobre o Holocausto lá fosse, veria aquelas paredes e aqueles campos com olhos bem diferentes – dir-se-ia indiferentes até. Não só esta ideia me fez sentido, talvez porque a minha inquietude ainda estivesse presente, mas também porque isso me fez pensar sobre a importância de manter a memória futura para evitar o repetir de tão hediondos crimes. Quem não saiba o que ali aconteceu pode um dia acreditar que não aconteceu – o que não se sabe não existe. Sobre a informação, o conhecimento, a motivação e a acção falarei oportunamente – até porque só consigo perceber que tais crimes se tenham passado, numa sociedade que não os conhecia. E também por isso é de alguma forma responsável por eles. É esse sentimento que ainda me mantém inquieto – uma inquietude que eu não tenho a certeza ainda se quero que passe!

sexta-feira, 11 de agosto de 2006




Dá-se o caso de ter ligações profissionais a uma organização polaca, pelo que travei conhecimento há cerca de 4 anos com um grupo de polacos ligados a essa organização. Pessoas formais mas simpáticas, destoam do resto do grupo por estarem sempre vestidos de forma mais formal que toda a gente – diga-se que o grupo de trabalho além de polacos e portugueses tem espanhóis, belgas, holandeses, alemães e uma grega – são sempre muito formais nos cumprimentos e nas conversas. Numa primeira análise dir-se-ia que são algo contraídos. Na verdade, são pessoas muito próximas e preocupadas, tentando sempre agradar e ajudar sinceramente.

Receberam-nos nesta última visita – feita apenas por um grupo de portugueses – de forma exemplar. Diria mesmo até familiar. Tivemos no entanto uma surpresa algo intrigante. Quando mostrámos interesse em nos deslocarmos a Oswieçim, mostraram-se muito surpreendidos, dizendo que somos os primeiros convidados estrangeiros deles que haviam comentado tal interesse. Inquiriram-nos de imediato qual a motivação com um ar bastante consternado. Ao dizermos que considerávamos obrigatória aquela visita, por acreditarmos ter-se tratado do maior crime cometido contra a humanidade, aliviaram o semblante dizendo apenas que é uma visita para se fazer uma vez na vida. Ficámos ainda mais curiosos e perguntámos se já haviam lá estado, ao que nos responderam que a escola primária havia organizado visitas aos campos de concentração, tendo todos ido lá desta forma. Quando perguntámos se haviam lá voltado, apenas um referiu ter ido segunda vez, justificando que havia lá levado o filho por este não ter tido a oportunidade de ir antes, uma vez que supostamente as escolas já não organizam visitas como faziam no seu tempo. Trataram-nos de todos os detalhes, como horários, preços de bilhetes, trajectos, tempos de percurso, etc.

Percebemos então que afinal até estavam satisfeitos por querermos ir a Oswieçim, pese embora a reacção de desconfiança e incómodo inicial. Com o seu apoio conseguimos fazer um trajecto de cerca de 5 horas para cada lado num só dia, acordando às 3:30h da manhã e voltando às 02:00h do dia seguinte. Mas sem dúvida que valeu a pena o esforço.



Foto do muro de execução em Auschwitz I.

terça-feira, 8 de agosto de 2006


State Museum in Oswieçim
A minha recente viagem à Polónia mudou a minha forma de ver o mundo. Todas as viagens o fazem, de uma forma ou de outra, mas esta foi tão forte que não resisti a entrar no mundo internáutico dos Blogues, para a partilhar.
Ao longo de alguns textos, conto partilhar o que foi a minha visita a Oswieçim, local assim designado por vontade dos seus habitantes, mas que foi renomeado durante a 2ª Guerra pelos invasores alemães como Auschwitz.
A Polónia, sem vaidades nem glórias vãs, merece-me este respeito. Não porque irei escrever algo que nunca antes tenha sido escrito, e seguramente com mais propriedade. Mas porque os sentimentos que me despertou esta viagem foram tão fortes, que não consigo calar este grito de revolta que sinto cá dentro.